sábado, 25 de abril de 2015

Inconstâncias



Movimentado, sim.


Aos poucos, aos trancos, nos barrancos, o movimento de ir e vir até você reconstrói em mim caminhos já desfeitos por vidas passadas. Neste movimento de sentir, acabo construindo pontes entre mundos distantes, com aquilo que eu pensei que jamais voltaria a fazer parte do que sou.
Mas essas são constatações inocentes demais para umamulher de idade tão avançada.



Seguir na crença de que há caixinhas que separam as muitas vidas que vivemos em tão curto espaço de tempo assemelha-se à espera por papais noéis e coelhos da páscoa. Uma bobice faceira que não encontra sentido quando, ao passar dos anos, deparamo-nos com a única certeza que podemos ter: no fim, tudo é resultante de uma construção que nunca para, nunca para, nunca para ...


O fato de que a vida não para (e a vida é construção!) apenas acelera em mim batimentos cardíacos inconstantes. Ver-te é reverter essa lógica que eu vivia até há pouco tempo atrás. Ter você em minha vida é quebrar barreiras que eu construíra com carinho - mesmo sem estar ciente deste trabalho de pedreiro dedicado que assenta muros em torno de si. Cada tijolo era milimetricamente acoplado nestas auguras. Cada dor era um tijolo de consistência bruta, de segurança demarcada.

Então você apareceu com um martelo e uma pedra, singelos. Enquanto meu coração batia acelerado por você, a força do martelo batia serena e constante nos meus muros tão estruturados.




Aos poucos, não foi possível mais estipular metas, prazos, caminhos: tudo em mim seguia com a pureza das crianças que estendem as mãos para as pontes que a vida oferece. Fiz de mim a ponte para deixar sentir o que não me permitia mais. Dentro de mim, a constância foi virando areia ao chão. Por isso (e apesar disso) hoje é outono. Outono na forma mais equilibrada de se outonar. Folhas ao chão, ventos gelados, chuvas finas na janela do quarto. Outono com a beleza de uma estação passageira, resultado das belezas vivas de um verão - resultando em frios, porém envolventes, dias de inverno. No caminho entre sol e neve, o outono é a ponte que nos leva a aceitar essa eterna inconstância do tempo.

Tão inconstante quanto as diversas formas de amar e os tantos elementos que compõem o amor.



Não há como negar o movimento.



São os pés e as mãos e a cabeça. O coração e as pontes de sentimentos. Tudo vibra e a vibração faz com que saiam do lugar do certo, da equilibrada arquitetura do que evita ser vivo. Construo pontes no meu caminho.
Segura no meu papel de ser a ponte, evitava a construção com medo de medidas inexatas e do encontro com caminhos tortuosos. Hoje, aceito construir pontes e sair do lugar do mesmo. Aceito as inconstâncias de uma estação do ano, de duas, das quatro, por que não?

E enquanto isso, o martelo insiste em bater em minha casca.



[c.b.o.]