domingo, 30 de junho de 2013

Chama e fumo






Amor - chama, e, depois, fumaça...

Medita no que vais fazer:

O fumo vem, a chama passa...


Gozo cruel, ventura escassa,
Dono do meu e do teu ser,
Amor - chama, e, depois, fumaça...

Tanto ele queima! e, por desgraça,
Queimado o que melhor houver,
O fumo vem, a chama passa...

Paixão puríssima ou devassa,
Triste ou feliz, pena ou prazer,
Amor - chama, e, depois, fumaça...

A cada par que a aurora enlaça,
Como é pungente o entardecer!
O fumo vem, a chama passa...

Antes, todo ele é gosto e graça.
Amor, fogueira linda a arder!
Amor - chama, e, depois, fumaça...

Portanto, mal se satisfaça
(Como te poderei dizer?...)
O fumo vem, a chama passa...

A chama queima. O fumo embaça.
Tão triste que é! Mas...tem de ser...
Amor?...- chama, e, depois, fumaça:
O fumo vem, a chama passa.
-

Manuel Bandeira

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Aviso na Garrafa

Hey,

Sei que você está aí:
Perdido no Universo.
E também sei que será preciso muita,
muita, muita coragem
para chegar até mim.
Saiba que espero,
impaciente.
Um beijo
E boa viagem.

[Criseida]

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Mundo Grande



Não, meu coração não é maior que o mundo.

É muito menor.

Nele não cabem nem as minhas dores.

Por isso gosto tanto de me contar.

Por isso me dispo,

por isso me grito,
por isso freqüento os jornais, me exponho cruamente nas livrarias:
preciso de todos.

Sim, meu coração é muito pequeno.
Só agora vejo que nele não cabem os homens.
Os homens estão cá fora, estão na rua.
A rua é enorme. Maior, muito maior do que eu esperava.
Mas também a rua não cabe todos os homens.
A rua é menor que o mundo.
O mundo é grande.

Tu sabes como é grande o mundo.
Conheces os navios que levam petróleo e livros, carne e algodão.
Viste as diferentes cores dos homens,
as diferentes dores dos homens,
sabes como é difícil sofrer tudo isso, amontoar tudo isso
num só peito de homem… sem que ele estale.

Fecha os olhos e esquece.
Escuta a água nos vidros,
tão calma, não anuncia nada.
Entretanto escorre nas mãos,
tão calma! Vai inundando tudo…
Renascerão as cidades submersas?
Os homens submersos – voltarão?

Meu coração não sabe.
Estúpido, ridículo e frágil é meu coração.
Só agora descubro
como é triste ignorar certas coisas.
(Na solidão de indivíduo
desaprendi a linguagem
com que homens se comunicam.)

Outrora escutei os anjos,
as sonatas, os poemas, as confissões patéticas.
Nunca escutei voz de gente.
Em verdade sou muito pobre.

Outrora viajei
países imaginários, fáceis de habitar,
ilhas sem problemas, não obstante exaustivas e convocando ao suicídio.

Meus amigos foram às ilhas.
Ilhas perdem o homem.
Entretanto alguns se salvaram e
trouxeram a notícia
de que o mundo, o grande mundo está crescendo todos os dias,
entre o fogo e o amor.

Então, meu coração também pode crescer.
Entre o amor e o fogo,
entre a vida e o fogo,
meu coração cresce dez metros e explode.
– Ó vida futura! Nós te criaremos.
-

Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 17 de junho de 2013

nostalgia

Me sinto incompleta.
E quanto mais incompleta me sinto
Mais vago na tentativa de preenchimento de uma incompletude
que é toda
ar, vazio e pensares.

c.b.o.

domingo, 16 de junho de 2013

Um resumo da semana - atribulada.



Quanto mais avanço, mais nítido fica o que deixo para trás.

A.D.


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Eles se alimentam do nosso medo.

Se fartam enquanto nós nos mantemos na zona determinada.

Fadados ao contínuo, como se no sempre as coisas houvessem sido assim.

Mas eles também comentem erros.

Eles nos deram escolas para que aprendêssemos o sistema.

E, de lápis e cadernos nas mãos, encontramos as falhas,

Descobrimos os furos.

Eles agora temem que a gente saiba,

Que a gente lute,

Que a gente acorde.
Enchem de gás os olhos de quem aprendeu juntar A+B.
Ferem nosso orgulho,
Tentam nos dividir.
Entretanto, somos osso duro de roer
Viemos do lugar de nada que nos foi imposto
E sabemos do lugar de igualdade que nos origina.
Eles devem temer.
Devem fremir a cada grito, a cada rosa, a cada canção.
Devem continuar a tentativa de violentar nossos corpos,
Pois, hoje, temos peso,
Temos voz.


C.B.O


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Sou forte mas também destrutiva. Autodestrutiva. E quem é autodestrutiva também destrói os outros. Estou ferindo muita gente (...)
E também me dói quando percebo que feri. Mas tantos defeitos tenho. Sou inquieta, ciumenta, áspera, desesperançosa. Embora amor dentro de mim eu tenha. Só que não sei usar amor: às vezes parecem farpas.

(Poderia ser C.B.O, mas é Clarice...)


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Tão bom morrer de amor e continuar vivendo.

Mario Quintana.


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... que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica, nem com balanças, nem com barômetros, etc... Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produz em nós.

Manoel de Barros


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Sobre o Amor Maduro.



Amor é privilégio de maduros

estendidos na mais estreita cama,

que se torna a mais larga e mais relvosa,

roçando, em cada poro, o céu do corpo.




É isto, amor: o ganho não previsto,

o prêmio subterrâneo e coruscante,

leitura de relâmpago cifrado,

que, decifrado, nada mais existe




valendo a pena e o preço do terrestre,
salvo o minuto de ouro no relógio
minúsculo, vibrando no crepúsculo.

Amor é o que se aprende no limite,
depois de se arquivar toda a ciência
herdada, ouvida. Amor começa tarde.
Carlos Drummond de Andrade
-

Carlos Drummond de Andrade



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quinta-feira, 13 de junho de 2013

Mimosa boca errante









Mimosa boca errante

à superfície até achar o ponto
em que te apraz colher o fruto em fogo
que não será comido mas fruído
até se lhe esgotar o sumo cálido
e ele deixar-te, ou o deixares, flácido,
mas rorejando a baba de delícias
que fruto e boca se permitem, dádiva.

Boca mimosa e sábia,
impaciente de sugar e clausurar
inteiro, em ti, o talo rígido
mas varado de gozo ao confinar-se
no limitado espaço que ofereces
a seu volume e jato apaixonados
como podes tornar-te, assim aberta,
recurvo céu infindo e sepultura?

Mimosa boca e santa,
que devagar vais desfolhando a líquida
espuma do prazer em rito mudo,
lenta-lambente-lambilusamente
ligada à forma ereta qual se fossem
a boca o próprio fruto, e o fruto a boca,
oh chega, chega, chega de beber-me,
de matar-me, e, na morte, de viver-me.

Já sei a eternidade: é puro orgasmo.

-
Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 3 de junho de 2013

é



Quem nos quiser amar agora ,

terá de vir com calma ,

terá de vir com jeito .

Somos um território protegido por muros de receio .

Quem quiser vir agora terá de ter paciência .

Terá de ter sabedoria .

Mas ainda que não tenha nada disso ,

virá e vai nos invadir ,

e vai nos desarrumar ,

e vamos renascer

com este desconserto .
Pois estávamos fora da realidade , fora do mundo ,
fora de nós .
A aventura do amor nos devolve a nós mesmos.
-

Lya Luft

De frente com Cadu.



Esta noite me sinto uma Carrie Bradshaw. Chego em casa, há uma noite chuvosa de outono lá fora, após um encontro com um amigo. Sento em frente ao computador para escrever, com meus cabelos longos, cacheados, presos da mesma forma que a fictícia escritora costumava aparecer em sua série. Ela escrevia sobre sexo, sobre a cidade, sobre o amor.




Eu, nesta noite, após esta conversa, escrevo sobre reencontros. Sentir que no outro há algo que você esconde de si mesmo. A capacidade de dissimular nosso mais puro elemento. Me perco nas palavras ao tentar representar meus sentires.

Uma conversa que me muda, que me molda. Um sentir-se em casa, ao falar com alguém que, de tão seu amigo, é uma parte de você também. Só posso ser grata. Grata por sentir e por ver concretizado, em palavras, sensações e sentimentos que eu pensava ser tão egoisticamente meus. Que eu, iludida, acreditava que nenhum outro ser pudesse sentir: eu alienante, alienígena.

Ao encontrar esse amigo, constatei que o amor, os amores, se produz na vida, nas mudanças da vida, nos passados e presentes, nesse limbo entre a experiência e a necessidade de um porvir totalmente novo – apesar da consciência de que o novo nunca será plenamente novidade.

Comungo com o mundo minha vontade liberta de dizer que sou uma pessoa com um passado que me preenche, mas não me transborda. Sou alguém que vislumbra o que teve, mas teme, pesarosamente, o que há de vir, e por isso vacila.

Sou uma pessoa imperfeita, repleta de desejos que reprimo. Repleta de medos que me limitam. Repleta de sensações que me amputam as ações. Repleta de “já sei o que vem”, impedindo a possibilidade do novo.

Essa, Carrie, sou eu.

O amor bate em minha porta, nesta noite, como as gotas de chuva tintilam minha janela: na forma de um sopro, na forma amiga, mostrando quão frágeis são os meus vidros.

Este, o amor, o estranho, o intruso, o parente que você não quer receber, o outro que você não sabe lidar, o medo de que o que é mais seu possa aparecer, o novo, o belo, o vital, o surpreendente.

Escrevo, hoje, para demonstrar que minhas frágeis mãos encontram consolo nos ombros amigos que cruzam minha vida. Nas palavras mais sinceras que penetram minha alma. No encontro mais simples que a amizade pode gerir.

Amar, neste outono, continua sendo possível.
C.B.O.

sábado, 1 de junho de 2013

Cá entre os botões

Os meus sonhos não estão esmagados, estão escondidos.
Me enraivece sentir e saber que tão pouco é dado às minhas mãos, que suportam o peso do mundo.
Me enraivece, mas me fortalece.
A certeza de que o porvir será leve, como a leveza das águas que merecem o rio, me desloca para que eu espere a vindoura surpresa que retire do vácuo meu cálido coração embrulhado.

C.B.O.