quinta-feira, 15 de agosto de 2013

O processo nosso de cada dia

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As minhas mãos estão fartas e eu preciso espalhar por aí essa legião de palavras que me transborda. É preciso que eu grite e não exploda. É preciso que a escrita seja meu caminho urgente de libertação; como usualmente é. Mesmo sem destino ou sem retorno, ela sai e na ida carrega consigo todos os apertos de viveres do processo de retempero que ocorre dentro de mim.
Sobre esses processos que sou obrigada a falar. É a temática que escorre em mim pelos poros: do osso às lágrimas.
Passei pelo processo. Uma redenção, um prender-se à si só, como um caminho desconhecido por uma longa noite gélida e sem luzes. O caminho, meu camarada, é in.
Assim já dizia Caio Fernando, todo sábio em sua acidez de palavras. E por sua proteção linguística, segue meu mote:
--O processo é in, não é off.

Recomeço a escrita por aqui: O processo nosso de cada dia - Take 2.
Corremos. Eu corro, tu corres, ele corre (mas o tu nem mais existe!). Corremos. Todo tempo. Limitados por 140 caracteres, corremos. Com um medidor de qualidade de vida que tiquetaqueia em nossos pulsos, corremos. Pelas sarjetas que jogamos nosso lixo e onde dormem cachorros e seres a-sociáveis, corremos. Não envelhecemos mais na corrida contra o tempo. Há pílula para tudo: para correr, para dormir, para comer, para as diferentes escolhas que a gente não faz na vida.
Corremos... alucinadamente... corremos... arfamos... corremos, uma perna atrás da outra... corremos... dores que surgem e nos aplacam... corremos... suores que nos atrapalham a visão... corremos... pedrinhas que intercalam o caminho... corremos... chuvas... corremos... ônibus... corremos......... Cai.

Recomeço, pelo take 3: Processando a vida. Let's go!
Quem sabe dessa vez consiga eu divagar menos e  colocar no papel as palavras e frases e orações e pontos-e-vírgulas que ficaram tão claros em minha escrita mental.
É in, não off.
Estive dentro do processo. é sufocante. nada, de repente (e não é nada de repente), faz sentido. quando você cai no processo, é porque muita água já rolou. é porque os por quês são em demasia. é uma fruta sem gosto, um som sem sintonia, uma cor que se esvai dentro de você.
Assim, dentro do non sense, você se perde.
Quando nos perdemos, o processo, que é in, não off, se faz necessário.
Alguns paliativos até nos enganam: mas   quem tá no processo sabe que não há fuga.
Não há pastilha salvadora, cara, o que cura o de-dentro é só o In. Mas, usar das chagas para inventar em si próprio o antídoto, dói: é preciso tomar do próprio veneno para se refazer.
É in, não off.
Quando está em processo, de nada adianta ter os melhores amigos, a melhor família, ouvir as melhores piadas, escutar os melhores conselhos ou ler os melhores livros. Ter o melhor afago do melhor amigo do homem ou fazer os melhores passeios, é vão: tudo em você está manchado de fel.
Até os amigos, no repente, assumem a fisionomia distorcida, do inimigo em propensão. Eles tomam decisões desgostosas, possuem atitudes monstruosas. Os amigos. Amigos?
É in, não é off.
Por ser in, nos enclausuramos a ponto de não encontrarmos a porta de saída. Ficamos tão in, em nosso casulo, cultivando nossas interrogações num calor quase maternal, que bem fica difícil retornar.
O passo de abrir as mangas da camisa e escancarar na janela sua pele escamada pelo longo processo é tão difícil quanto deve ser ao vampiro sair ao sol.
Dói.
É o processo in que vai ao off.
O abrir os olhos numa imensa luz branca, é o medo diante do salto. O sorriso frouxo. A piada insegura e a conversa mole.
Não mais corremos então. Trafegamos em um processo de balsa no rio caudaloso. Ou então canoa (aí é o processo de cada um que define). Mas ninguém passa feito jet ski na travessia.
O processo é in, é processo, é a calma no desejo alucinado de atingir o off. Uma calma que não há, enquanto o processo dura, e que nos prende pelo umbilical, quando as janelas se abrem.
Quando o processo cura o in, feito mágica, as órbitas começam a se encaixar novamente. Aquele recado que nunca chegava, se multiplica; o gesto de carinho que era  tão necessário, finalmente chega; um olhar atento enfim paira sobre você. Todos os gritos mudos que você deu, no durar do processo, ecoam nesse universo ao seu redor. É uma reconciliação entre o in e off, que se distanciaram por séculos durante aquelas intermináveis semanas de processo.
Nem por isso é fácil. O processo é silenciosamente cruel, de ambos os lados. Mas, feito metal inoxidável, viabiliza sua proteção de vida.
O processo é todo dia, meu chapa. Mas  corremos tanto, sempre, que poucos, como você, conseguirão chegar ao fim dessa pequena trilogia de um recomeço.
E poucos retornam do processo.


C.B.O.

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