sexta-feira, 4 de julho de 2014

O essencial não é invisível aos olhos, mas transmissível por eles.

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Troco o ditado, dou um pontapé no destino, faço careta para a mesmice, desafio o mais difícil dos caminhos a me encarar.

Afinal, de que partes se constroem os sentimentos? A contramão da palavra, os encontros cotidianos, os em-comum, a profundidade dos discursos, a exatidão na escolha lexical?

Ah, os sentimentos.

No despertar de novas auroras, abri meus olhos para enxergar os devidos meios. Não julgara possível que a ausência de palavras se fizesse presença avassaladora, impactante, surpreendente, do amor.

Assim tem sido, tal qual o terceiro homem de "Teresinha". Sempre soube que seria meu destino carregar esta Teresinha do Chico em mim. Relembro os versos que soam como minha auto-trilha sonora e dizem o terceiro me chegou como quem chega do nada - ele não me trouxe nada, também nada perguntou. Não sei como ele se chama, mas entendo o que ele quer: se deitou na minha cama e me chama de mulher.

Fez-me mulher.

O olhar é o instrumento mais completo que carregamos em nossa carcaça física. Mais que o coração, que age sozinho em suas entranhas e só (se) libera ao outro quando lhe apetece. E erra muitas vezes quantas ao não fazer esta escolha.

E os olhos, como escondê-los? Traduzem todas as línguas possíveis e imagináveis, coroam os sentimentos mais belos, assim como os mais amargos. Doçuras de olhar no fel.

Foi o olhar que falou por mim. Pelo olhar que entendi o outro. Olhamo-nos. Deixei que, ao pegar minha mão, todo meu eu se entregasse. Num incompreensível desenlace do eu-comigo. Cai de cara na entrega. Apenas olhares e a mão feito ponte. Dedos que se encontraram na materialização do não-dito. Guimarães nos antecipara: "e o menino pôs a mão na minha. Encostava e ficava fazendo parte melhor da minha pele..." Semi palavras trocadas.

Depois do amor, o dia-a-dia no seu mais ordinário. E no decorrer de fatos do ocaso, deparei-me com outro tipo de olhar que disse-me "Feliz por ter você, feliz por você ser assim." Ele me olhou fundo e fechou os olhos por um milésimo de segundo enquanto sacudia positivamente a cabeça após um gesto de minha parte que ele valorizara e estendera a mão e ajudara a executar. Senti uma felicidade gigante e compreensiva me invadir quando ele me aprovou com o olhar. Amamo-nos.

Não foram as palavras que nos levaram ao amor. Foi o sentimento já postulado que gerou em nós a necessidade de criar palavras, nossas, misturadas, reconhecidas: la langue de l'amour.

Durou o tanto de três dias. Um amor de três dias é melhor do que o nunca amar. O amor de três dias me fez acordar de pernas bambas após noites inteiras carimbadas de beijos que não me deixavam dormir. Felizmente não deixavam. Três dias de amor. No adieu, nos beijamos e ele se foi. Pedindo que eu fosse a seu encontro e com minha promessa de que iria, ele se foi. Selamos o último tchau com um beijo e seguimos caminhos opostos.

Olhei para trás. Ele também olhou. Nossos olhos, falantes, dizentes, novamente se beijaram.

[C.B.O.]

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