terça-feira, 29 de julho de 2014

Viajei

Alguns dias atrás mostrei a um amigo um texto sobre "viver em São Paulo", de um carioca que explicava sua teoria de que só passamos a amar São Paulo quando descobrimos a "nossa São Paulo".
Então, como proposta, pedi a ele que escrevesse um pouco sobre o que seria "viver em Montreal", já que ele é canadense e já que sei tão pouco sobre lá.
Em determinado momento de seu texto, ele disse "J'adore voyager, je n'arrêterais jamais, je serais prêt à vivre un peu partout. Mais je ne crois pas que je pourrais être heureux sans considérer Montréal comme chez moi. Home." (algo como que adora viajar, mas com certeza é feliz considerando Montreal como seu lar).
O que me restou, depois da releitura do texto sobre SP e do texto sobre Montréal? restou-me a certeza de que amo São Paulo também, que me acolheu com sua frieza, cheia de novidades e emoções, dores e encantamentos. Também surgiu uma emergente vontade de conhecer um pouco dessa Montréal que tem cara de lar e festivais e pessoas felizes no verão.
Mas o que mais ficou, todos esses dias, foi uma vontade grande de dizer que eu não tenho um lugar para chamar de lar. Não sinto, ainda, em mim, esse pertencimento tão pleno.
Eu nunca sai para o mundo. Nunca me aventurei tanto assim. Malemá sai de Jaboticabal e ainda não conheço nada além do estado de São Paulo (ok, é grande, mas não é o Brasil). Não deixei de fazê-lo por falta de ânimo, mas nunca houve tempo ou dinheiro suficiente para isso. Sempre penso em ir, sempre me vejo indo. Sempre me vejo de malas prontas para viajar sozinha, sim, plenamente sozinha, por ai. Acreditei tanto que passaria meus 27 anos sozinha, numa ilha isolada da civilização, feliz de estar assim, inteiramente comigo.  Mas não rolou. Ainda não rolou. Mas esses sonhos perturbam minha mente.
Escrevo hoje, nove dias depois da conversa com meu amigo canadense, porque, em um almoço com uma amiga, de repente, ela me disse que eu pertencia ao mundo, não ao Brasil. Oi? Sim, ao mundo.
Conversávamos sobre o fato de que sempre que eu me envolvo emocionalmente com alguém, essa pessoa embarca em uma viagem (provisória ou definitiva) para longe de mim. Dói me sentir a mulher-passaporte. Então ela disse: "Cris, isso significa que você tem que ir também, você não tem que ficar aqui, "ele" está lá fora te esperando."
Sair ao mundo por causa de um "ele" seria uma atitude incoerente da minha parte. Com "ele", eu sairia alucinadamente, mas sair "à caça" não faz muito meu estilo. Eu gosto de deixar as coisas acontecerem no seu tempo correto, acho que essa busca alucinada por amor traz tudo, menos amor de verdade. Quando a gente menos espera ele nos espeta (mas é preciso estar atento!).
De todo modo, fiquei pensando em algumas outras definições que já encontrei sobre mim (sim, é possível me definir) e que diziam que eu era do mundo. Onde está, então, minha coragem para encarar o mundo que me espera ansioso? Onde encontro forças para ir?

Eu precisava deste desabafo escrito, doloroso, esse assumir o não-pertencimento, a falta de raízes, a carência de um lar.
De repente me pareceu tão bonito ter um lar.
De repente me pareceu que meus mais novos 27 anos são tempo demais para não ter ido.

[Criseida]

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